CHOVE







Às vezes não vou, os meus pés não podem ir, o meu corpo agarra-se preso a pele e ossos e fico dentro dele.


Parada.


Mas se quiseres podes sentir-me perto de ti, tão perto que me podes abraçar e beijar e ouvir-me contar-te histórias como se nunca tivesse saído do aperto da tua mão.


Os sons que me levam são o troar do meu grito quando fecho os olhos e peço à chuva que te lembre que te choro e não posso ir.

INVISÍVEL





A invisibilidade dos sentires leva ao caminho da invisibilidade total.


Trespassamo-nos nas ruas, no cruzar apressado de cabeça e alma, fugimos da troca de olhares, receamos os fluidos quimicos da atracção.


Esbarramos em nós mesmos, que dos outros vemos o reflexo do que não queremos ver em nós.

MULHER-TERRA







O Tango tem a arte do corpo-a-corpo na contenda por terra.


Terra de mulher, coração de mulher, amor de mulher.


Disputam-se centímetros pelo som de passos que enxotam o outro, marca-se o ritmo na agilidade do volteio, imitam-se caretas e devaneios na zombaria da dança errada e se das mãos se fazem armas logo mais deslizam na terra moldando amores.

A AVENTURA DOS SONHOS







Cavalgo na loucura dos sonhos, trote rápido e vivo no encalce de outras cruzadas.


De amazona dou montada a quem me der a mão, estribo seguro mas sem freio aperreado que os meus caminhos rasgam-se na descoberta do que não vejo, na senda de um amor maior que o tamanho dos meus desejos.


Se fores bravo segues-me.


Apenas posso prometer aventura à velocidade do som.

DAR A OUTROS DE MIM







Libertam-se palavras de mim como sons de um ataúde gemido entre dedilhares solitários, sem ouvinte, sem espectador que os apupe ou aplauda.


Lamento as lágrimas secas que emprestei a outros de mim e agora, mesmo doendo tanto, não sei como chorar.

PIEDADE






Vou deslizando a quatro, marcando ritmos pelas pegadas de som que vais deixando tombar da tua voz, sigo-te cativa no feitiço que marca trilhos até ao desejo.


Já vou rendida e no corpo-a-corpo que pressagio a vitoria é dos sentires.


Só te peço piedade no despojo da essência.


Ardo...

HISTÓRIAS DE PAUTAS





Pede-me esta dança que eu vou.


Façamos uma história de amor pelo tempo que a música durar.


Depois escreverei um livro onde contarei tudo e essa história será a lembrança de acordes de um tempo profundo.

O GRITO




Dos sons que projecto a chamar-te, de todos os gritos, berros, ameaças e até o ultimatum de nunca mais cantar a nossa música só um ouviste.


O meu silêncio.

RESPIRARE




E de repente é tudo tão relativo.




Tudo tão pequeno, tão sem importância à vista da dor que embarca no peito e se faz nau e aprende as rotas de todas as veias navegando sangue de saudades por todos os tempos que se fecham na lembrança do que pareceu um dia ter estado vivo e presente.




Respirar-te.




Ouvir-te.

AQUI OU EM LUGAR ALGUM






Se estalares os dedos apareço, dobro a esquina, bato à tua porta por detrás de um laço que me esconda as lágrimas e a fragilidade de ser quando apenas tu quiseres que eu seja, que eu apareça, que esteja perto de ti e aperte a tua mão nos momentos só.


Sempre ou quando te apetecer.


Eu sou o som da tua voz.

MAIS UMA VEZ





Parece que tudo se quebra, se rompe , estraçalha o coração nas promessas de tanto amor ao vento.


Ao vento foram-se dores, palavras, juras, vão agora as lágrimas. Secam-se feridas na ferida que abre um novo amor.


É só mais uma vez, é tudo outra vez.

ECO DE TI






Vê-te, olha-te no mundo que te envolve e te molda, modifica, espalma, mirra.




Vê o teu futuro no que és hoje.




Abre os olhos ao som da vida e desenha novas linhas na pauta do teu coração, enche-te na magia de escutares os outros e canta, canta muito e sempre para que o eco do teu sentir se faça universo de ti mesmo.

UNÍSSONO




Não preciso dizer-te palavras para entenderes o som que propago desde o meu peito até ao teu.


Outras pontes se constroem pelo olhar e pelos desenhos das mãos contra sombras na parede que imitam a ti e a mim a dançar.


Os passos aprendemo-los enquanto a vontade aqui estiver.


E das canções basta o compasso descompassado de escutarmos o mesmo tom.